BABESIOSE CANINA
Resumo
Foi
diagnosticado com Babesiose um cão, fêmea, 12 anos, SRD, em CC no interior do
estado de São Paulo. O tratamento foi baseado nos sinais clínicos e no
resultado positivo para o teste de hematozoários. O animal foi tratado com
Doxiciclina num período de 28 dias e suplementado devido a anemia apontada pelo
hemograma. Após o tratamento o proprietário relatou que a animal apresentava-se
saudável podendo concluir que a terapêutica foi efetiva.
Palavras-Chaves: Bebesia sp.
Canino. Babesiose. Trombocitopenia. Relato de caso.
BABESIOSIS CANINE
Abstract
Babesiosis was diagnosed with a dog, female, 12 years, SRD in CC, in the
state of São Paulo. The treatment was based on clinical signs and positive
result for the test hematozoa. The animal was treated with doxycycline within
28 days and supplemented due to anemia indicated by the blood test. After treatment
the owner reported that the animal had themselves healthy can conclude that the
treatment was effective.
Key words: Babesia sp. Canine. Babesiosis. Thrombocytopenia. Case Reports.
INTRODUÇÃO
As espécies de Babesia são protozoários do filo Apicomplexa que parasitam os
eritrócitos de seus hospedeiros vertebrados, sendo o eritrócito a única célula
do vertebrado parasitada. Para os membros do gênero Babesia, a reprodução sexuada ocorre no lúmen intestinal do
carrapato e a esporogonia no epitélio da parede intestinal do carrapato. A
esporogonia ocorre na hemocele do carrapato, os esporozoitas, por sua vez, multiplicam-se
no ovário da fêmea infectando as larvas que iram eclodir de seus ovos.
Esporozoítas são também observados em grande quantidade nas glândulas salivares
penetrando no próximo hospedeiro quando este for picado pelo carrapato (BOWMAN,
2009)
São conhecidas duas espécies do
gênero Babesia capazes de provocar infecção natural em cães, a B. gibsoni e a
B. canis. Esta última é classificada em três subespécies: B. canis rossi, B.
canis canis e B. canis vogeli (Kuttler, 1988, Uilenberg et al., 1989).
Os vetores da babesiose canina são os carrapatos pertencentes à família Ixodidae.
Os principais responsáveis pela transmissão da doença são os carrapatos da
espécie Rhipicephalus sanguineus, o carrapato vermelho do cão. Outras
espécies, como Dermacentor spp., Haemaphysalis leachi e Hyalomma
plumbeum, também podem trasmitir o agente (BRANDÃO; HAGIWARA, 2002).
A forma aguda da doença é a mais
comum, enquanto a forma hiperaguda ocorre apenas com as linhagens mais
virulentas. A moléstia hiperaguda caracteriza se por choque hipotensivo,
hipóxia, lesão tecidual intensa e estase vascular. Ocorre ocasionalmente em filhotes
de cães infectados, não tendo sido relatada em animais adultos. Geralmente,
observa-se choque, coma ou morte em seguida a menos de um dia de anorexia e
letargia, podendo, ainda, ser observada hematúria. A moléstia aguda é
caracterizada por anemia hemolítica, trombocitopenia e esplenomegalia. Especialmente
em cães jovens ou em adultos infectados por B. gibsoni, podem ocorrer
óbitos, mas a maioria dos animais irá recuperar-se. Também são comumente observados
anorexia, letargia e vômitos. Podem ser notadas ainda hematúria e icterícia, principalmente
em cães infectados por B. canis, podendo ocorrer também linfadenopatia generalizada
e edema periorbitário. A anemia hemolítica imunomediada é a principal moléstia a
ser diferenciada da Babesiose (TABOADA; MERCHANT, 1997).
As infecções
crônicas caracterizam-se por febre intermitente, diminuição do apetite e considerável
depleção do estado físico Terminalmente, tornam-se evidentes insuficiências
hepática e renal. A B. gibsoni causa, caracteristicamente, doença
crônica, apresentando como principal sinal uma anemia progressiva. A diversidade de sinais clínicos observados nas
diversas manifestações da babesiose canina provavelmente é devido a infecções
mistas, por Babesia spp. e Ehrlichia canis (TABOADA; MERCHANT,
1997).
Em cães com
babesiose, é comuns a detecção de anemia regenerativa, hiperbilirrubinemia,
bilirrubinúria, hemoglobinúria, trombocitopenia, acidose metabólica, azotemia e
cilindros renais. As principais anormalidades hematológicas observadas em
animais são a anemia e a trombocitopenia
A anemia observada geralmente é normocítica normocrômica de baixa intensidade
nos primeiros dias após a infecção, tornando-se macrocítica,hipocrômica e
regenerativa à medida que a moléstia progride. A reticulocitose é proporcional
à gravidade da anemia. Anormalidades leucocitárias são observadas inconsistentemente,
podendo ser: leucocitose, neutrofilia, neutropenia, linfocitose e eosinifilia (TABOADA;MERCHANT,
1997).
Por meio da
análise citológica do esfregaço sangüíneo ou do aumento do volume plaquetário
médio, é possível a identificação da presença de macroplaquetas, a qual, por
sua vez, é indicativa de uma intensa trombopoiese, que resulta na liberação
acelerada de plaquetas jovens na circulação. Isto exclui a possibilidade de
erliquiose canina crônica, onde há diminuição do número de plaquetas
circulantes como conseqüência de uma hipoplasia megacariocítica (BRANDÃO; HAGIWARA,
2002).
Nas infecções de longa duração, as hemácias
nucleadas são freqüentemente numerosas, podendo o hematócrito estar abaixo de 10%
e a concentração de hemoglobina, abaixo de 3,9 g/dL nos estágios terminais da
doença.
O diagnóstico
de babesiose é firmado pela demonstração da presença dos protozoários no
interior de eritrócitos infectados (TABOADA; MERCHANT, 1997). Os esfregaços
sangüíneos são confeccionados com sangue periférico e corados por colorações do
tipo Romanowsky, como Giemsa, Wright, Rosenfeld ou Diff-Quick.
Os eritrócitos
infectados são grandes e tendem a concentrar-se nas bordas da cauda do esfregaço
sangüíneo, enquanto eritrócitos infectados in vivo acumulam-se nos
capilares. Desse modo, esfregaços sangüíneos confeccionados a partir dos leitos
capilares periféricos na ponta da orelha podem demonstrar maior número dos
parasitas (TABOADA; MERCHANT, 1997).
O emprego de
técnicas de biologia molecular como a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) tem
sido de grande auxílio na identificação de animais portadores crônicos da
doença, bem como na avaliação da efetividade da terapia enquanto ainda não houve
redução dos títulos de anticorpos específicos. Embora ainda seja restrita a
centros de pesquisa, esta técnica permite a detecção de material genético do
parasita em praticamente qualquer material biológico (BRANDÃO; HAGIWARA, 2002).
RELATO DE CASO
Cão,
fêmea, 12 anos, SRD, 7kg, com queixa principal de apatia, anorexia, dispnéia
freqüente e um quadro de convulsão. A
vacinação e vermifugação estavam em dia, e não apresentava a presença de
ectoparasitas.
Ao exame
clínico foi relatado palidez de mucosa oral (FIGURA 1), freqüência cardíaca com
72 bpm, freqüência respiratória com 44 mpm, temperatura retal de 38,6°C,
condição corporal magra, hepatomegalia a palpação e linfonodos mandibular, pré
escapular e poplíteo normais. O TPC foi de 3 segundos aproximadamente apresentando
uma leve desidratação.
![]() | ||||||
PAREJA,A |
Aos
exames complementares observou-se baixo número de hemácias e hemoglobina,
hematócrito abaixo dos valores referenciais. Também observou-se na série branca
eosinopenia, trombocitopenia e monocitopenia, e aumento no número de
bastonetes. Os leucócitos, neutrófilos e linfócitos apresentou-se dentro dos
valores referenciais. O Hemograma revelou evidente anemia.
No teste
de função hepática avaliou-se ALT/TGP e FA, onde os valores se encontraram
normais. O teste de glicemia também apresentou-se normal.
A
Pesquisa de Hematozoários foi feito com a coloração de May Grunwald ( Giensa)
sendo positivo para Babesia sp.
O
Tratamento foi feito com dose única, IM de Diaceturato de diminazeno, e
Doxiciclina 10mg/kg/IM, BID. Após esses medicamentos recomendou-se por 28 dias
o uso oral de Doxiciclina e Cimetidina, BID. Também foi recomendado o uso oral
de ácido fólico, ferro quelatado e suplementação com Vit B6 e B12, bem como
Silimarina uma vez ao dia.
Com o
término do tratamento o paciente já se encontrava bem e os parâmetros dentro
das normalidades, se alimentando e bebendo água normalmente.
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PAREJA, A |
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Toda a
patogenia da babesiose está relacionada à hemólise intra e extravascular, ocasionada
por esta multiplicação do parasita no interior dos eritrócitos. Com o
rompimento das células parasitadas, além de causar anemia, ocorre liberação de
hemoglobina, o que gera hemoglobinúria e bilirrubinemia. (NELSON; COUTO, 2001;
SÁ, 2007).
O hematócrito
(VG) baixo indica anemia, e hemólise. E o aumento de bastonetes sugere um
desvio a esquerda.
A
trombocitopenia ainda não tem uma causa completamente esclarecida, mas acredita-se
que a destruição mediada por anticorpos e o consumo acelerado em decorrência de
uma reticulite endotelial ou do sequestro esplênico sejam os mecanismos mais
prováveis (BRANDÃO; HAGIWARA, 2002).
A fase
hiperaguda e aguda da infecção também resultam em febre, evoluindo para o
aparecimento de mucosas pálidas, perda de apetite, depressão, petéquias e hepatoesplenomegalia,
dependendo do estágio de infecção (ALMOSNY; MASSARD, 2002;CORREA et al., 2005).
Tabela 1 – Hemograma
Canino
Série
Vermelha
|
28/09/2013
|
26/10/2013
|
Valores
Referenciais
|
Hemácias
|
2,26 milh/mm³
|
6,20 milh/mm³
|
5,5 a 8,5
|
Hemoglobina
|
5,40 g/dl
|
13 g/dl
|
12,0 a 18,0
|
Hematócrito
|
16,6%
|
37%
|
37 a 55
|
V.G.M
|
73,5 u³
|
74,5 u³
|
60 a 77
|
H.G.M
|
23,9 pg
|
23 pg
|
19 a 23
|
C.H.G.M
|
32,5%
|
32,5%
|
32 a 36
|
Série
Branca
|
28/09/2013
|
26/10/2013
|
Valores
Referenciais
|
Leucócitos
|
9.000 mm³
|
9.050 mm³
|
6.000 a 18.000
|
Bastonetes
|
450 mm³
|
250 mm³
|
0 a 300
|
Segmentados
|
6.840 mm³
|
6.800 mm³
|
3.000 a 11.500
|
Eosinófilos
|
90 mm³
|
120 mm³
|
100 a 1.200
|
Linfócitos
|
1.530 mm³
|
1.600 mm³
|
1.000 a 4.800
|
Monócitos
|
90 mm³
|
150 mm³
|
150 a 1.350
|
Plaquetas
|
28/09/2013
|
26/10/2013
|
Valores
Referenciais
|
67.000 mm³
|
230.000 mm³
|
160.000 a 430.000
|
Tabela 2 – Exame Bioquímico
28/09/2013
|
26/10/2013
|
Valores
Referenciais
|
|
FA
|
71,0 U/l
|
-
|
20 a 156 U/l
|
ALT / TGP
|
29,0 U/l
|
-
|
20 a 86 U/l
|
GLICOSE
|
79,00 mg/dl
|
-
|
70 a 110 mg/dl
|
Tabela 3 – Pesquisa de Hematozoários
Pesquisa
de Hematozoários
|
28/09/2013
|
26/10/2013
|
Valores
Referenciais
|
Babesia sp
|
Positivo
|
Negativo
|
Negativo
|
A doxiciclina
pertence ao grupo das tetraciclinas e, apesar de ser um antibiótico bacteriostárico,
por inibir a síntese protéica dos microorganismos sensíveis, também possui ação
antimicrobiana sobre alguns protozoários. Uma recomendação é que a doxiciclina
não seja administrada conjuntamente a uma suplementação de minerais,
especialmente o ferro, devendo se respeitado um intervalo de duas horas entre a
administração de um e de outro. Isso porque interação deste fármaco com
minerais como cálcio, ferro, magnésio, zinco e alumínio pode prejudicar sua
absorção, pelas tetraciclinas formarem quelatos insolúveis com estes minerais (OUROFINO,
2009).
A Cimetidina é um antagonista de receptores H2, usado
no tratamento e profilaxia de úlcera duodenal, estados gástricos hipersecretórios,
profilaxia do sangramento digestivo em pacientes graves, refluxo
gastro-esofágico e inibe a secreção basal de ácido gástrico, reduzindo tanto o
volume quanto o conteúdo de ácido e de pepsina da secreção. Com isso evita
vômitos causados pelo antibiótico, aumentando a eficiência do tratamento.
A suplementação foi importante devido a
anemia que o paciente apresentava, e serviu como reposição de nutrientes já que
ela estava debilitada e com deficiências destes. A Silimarina é um composto extraído do fruto da Silybum
marianum, e foi utilizado como
hepatoprotetor.
O sucesso para
a recuperação do paciente em questão deveu-se à observação do proprietário em
perceber que o seu animal de estimação não estava normal e a disposição para
cura-lo. O tratamento com Doxiciclina demonstrou boa eficácia no tratamento do
animal com diagnóstico de Babesiose. A terapia de apoio também foi fundamental
para amenizar os efeitos colaterais da droga utilizada.
CONCLUSÃO
Portanto, a
babesiose canina é uma doença grave, e tem evolução rápida, geralmente de
caráter agudo, e que exige diagnóstico precoce e a terapêutica adequada. Para o
tratamento é necessário empenho e dedicação, pois o animal se apresenta frágil.
É uma doença
cosmopolita e todo o médico veterinário atuante na área clínica, deve se manter
atualizado sobre as áreas de risco, novos métodos de diagnóstico e técnicas
terapêuticas, para assim amenizar o impacto desta doença nos caninos.
REFERÊNCIA
BOWMAN,
D.D.; Lynn, R.C.; Eberhard, M.L. & Alcaraz, A. (2010) Parasitologia Veterinária de Georgis. Tradução de 9a edição (2008).
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Acesso em: 29 set 2013.
COUTO, C.G. Doença riquetsiais. In: BIRCHARD, S.J.;
SHERDING, R.G. Manual Saunders clínica de pequenos animais. 2.ed. São Paulo: Roca, 2003. p.138-143.
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MADEIRA,
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Acesso em: 29 set 2013.
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PINTO, R.L. Babesiose canina – relato de caso. Monografia de
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